O que é AI First e o papel do RH na implementação da novidade nas empresas
Entenda o que é AI First e como a inteligência artificial está mudando o mercado de trabalho e impactando empresas como o Nubank.

Ninguém duvida que a inteligência artificial impacta a rotina e o mercado de trabalho. Um novo termo aparece agora em apresentações de executivos e discussões corporativas: AI First, que, em português, significa “inteligência artificial em primeiro lugar”.
Mais do que utilizar ferramentas de IA para otimizar processos, o conceito AI First propõe colocar a inteligência artificial no centro da estratégia da companhia, como ponto de partida para decisões, criação de produtos e serviços e operação de negócios.
Grandes empresas já anunciaram que adotaram o conceito – e, para além disso, se autodefinem como AI First. No Brasil, é o caso do Nubank. No ano passado, o CTO da companhia, Vitor Olivier, um dos primeiros funcionários do banco, disse que o objetivo era aplicar IA em todos os departamentos da fintech e alcançar ganhos de eficiência, segurança e confiança do cliente.
No setor financeiro, a inteligência artificial pode ser usada para evitar fraudes quando, por exemplo, os bancos usam os dados dos clientes e conseguem mapear as rotinas ou localização do usuário, para o sistema conseguir identificar gastos fora do padrão de consumo, por exemplo.
Conversamos com dois executivos que trabalham com inteligência artificial sobre a adoção do novo modelo e as mudanças no mercado de trabalho: Bruno Szarf, VP Global de People & Performance do Grupo Stefanini, multinacional brasileira que fornece serviços de tecnologia, e Wagner Martin, VP de Relações Institucionais da Veritran, empresa de tecnologia que atua com o desenvolvimento de soluções financeiras.
O que é AI First
Se no começo dos anos 2010 as empresas passaram a desenvolver soluções pensando primeiramente na experiência dos celulares (mobile first), agora, o conceito AI First prioriza a criação de sistemas, serviços e produtos já pensando no uso da IA desde a concepção.
Apesar de muito se falar sobre o uso de IA nas empresas, fazer com que a companhia se torne AI First não é simples.
“A empresa AI First tem o core business pensado a partir da inteligência artificial. Ela trabalha com a tecnologia, tem redes neurais, algoritmos, inclusive gera códigos e utiliza automação de inteligência artificial nos seus próprios processos”, explica Wagner Martin.
Martin destaca que o desafio vem antes do treinamento das equipes em geral. Para conseguir se tornar AI First, a companhia precisa ter uma área de tecnologia robusta para preparar a linguagem, a rede e os algoritmos.
“É uma nova forma de pensar em como se aplica inteligência artificial, em como se repensa as ferramentas e os processos. Não é simplesmente fazê-los da mesma forma habitual, com velocidade ou eficiência maior”, afirma Bruno Szarf.
Depois que o time de tecnologia implanta o modelo, cabe ao RH e às lideranças facilitarem treinamentos e novos métodos de trabalho junto aos colaboradores.
Martin avalia que as soluções de IA costumam ser intuitivas e simples. Szarf conta que, no Grupo Stefanini, foi instituído um programa de embaixadores.
“Treinamos as pessoas com a metodologia AI First entre grupos que são mais seniores, intermediários e iniciantes, todos de maneira conectada. Isso se transformou em cem squads, que estão ajudando na melhoria e qualificação de todos os produtos e serviços”, explica.
Como a lógica AI First beneficia as empresas?
O processo pode ser custoso e longo, já que necessita de uma equipe de tecnologia dedicada e um sistema funcional, além de treinamentos eficientes. No entanto, traz benefícios, como:
- Automatização de tarefas repetitivas;
- Personalização em escala, com experiências adaptadas a cada cliente;
- Tomada de decisões orientada por dados, com maior velocidade;
- Criação de produtos com ciclos de desenvolvimento mais rápidos;
- Agilidade no atendimento com assistentes virtuais e roteirização inteligente.
Quais os riscos para os profissionais?
Se, por um lado, a adoção da inteligência artificial é uma oportunidade para as empresas, por outro acende um alerta para os colaboradores.
No fim de abril, a plataforma de ensino de idiomas Duolingo publicou, no LinkedIn, a decisão de se tornar AI First. No comunicado oficial, o CEO da companhia, Luis von Ahn, disse que a empresa se preocupa “profundamente” com as equipes, que faria treinamentos e mentorias, mas deixou claro que deixaria de contratar prestadores que fizessem tarefas que poderiam ser desenvolvidas pela IA.
Logo depois, a Duolingo lançou 148 novos cursos que foram desenvolvidos com ajuda da IA generativa. No texto para os investidores, a empresa diz que, historicamente, um único curso levava anos para ser criado. Em menos de um ano, o Duolingo desenvolveu dezenas de outros conteúdos da mesma forma.
Para Martin, quando uma empresa adota o conceito AI First, não há necessariamente um corte no quadro de funcionários, mas uma mudança de funções. Enquanto as tarefas mais simples podem ser automatizadas, as mais complexas e estratégicas continuam a cargo de humanos.
“Se a empresa tem inteligência artificial trabalhando para ela, passa a ter capacidade de prover mais serviços, promovendo uma escalabilidade. Ela terá mais clientes e precisa de equipes para atender estas pessoas. Isso continua funcionando”, diz Martin.
Ele acredita que haverá uma aceleração de carreiras, e os colaboradores alcançarão cargos sêniores mais rápido. “Essa é uma visão que o mercado ainda não está tendo, mas vai acontecer. É disruptivo.”
Além das transformações nas rotinas, também é necessário uma mudança cultural. “Exige mudar a maneira como a empresa pensa, opera e aprende. Não é um upgrade técnico, mas uma transformação cultural”, afirma Szarf.
O que dizem as pesquisas
Um estudo realizado pela LCA em parceria com a 4a intelligence estima que, no Brasil, mais de 31,3 milhões de profissionais desenvolvem tarefas que podem ser substituídas pela IA generativa, como o ChatGPT. Desse total, 5,5 milhões já estão em atividades com alto risco de substituição.
Já um levantamento da Organização Internacional do Trabalho (OIT) de maio de 2025 indicou que uma a cada quatro vagas de emprego no mundo pode ser transformada pela IA generativa.
Aqui vale o destaque: o resultado mais provável, dizem os pesquisadores, será a transformação – e não a substituição – de empregos.
O risco deve ser maior em países de alta renda e em vagas administrativas, que são facilmente automatizadas. O estudo também indica que as mulheres estão mais expostas e que políticas públicas de transição são fundamentais para garantir a qualidade do emprego.
Os pesquisadores separaram as profissões em quatro grupos, chamados de “gradientes” – com maior ou menor exposição e possibilidades de desemprego em relação ao uso de IA.
Apenas 3,3% dos trabalhadores globais se enquadram na categoria em situação mais crítica.
Veja abaixo as categorias e as ocupações:
Gradiente 1: A maior parte das tarefas tem pouco risco de automatização.
- Especialistas em métodos de educação
- Psicólogos
- Profissionais jurídicos e associados
- Fotógrafos
- Caixas e balconistas de bilhetes
- Físicos e astrônomos
- Técnicos em ciências da vida (exceto médicos)
- Assistentes de vendas em lojas
- Técnicos de pré-impressão
- Leitores de medidores e coletores de máquinas de venda automática
- Gerentes de hotéis
- Técnicos de galerias, museus e bibliotecas
- Arquivistas e clerks de cópia
- Mensageiros, entregadores de pacotes e carregadores de bagagem
- Assistentes médicos
- Vendedores de barracas e mercados
- Motoristas de carros, táxis e furgões
Gradiente 2: São profissões que misturam tarefas que podem e não podem ser automatizadas.
- Designers gráficos e multimídia
- Analistas de sistemas
- Profissionais de bancos de dados e redes não classificados em outras categorias
- Profissionais associados em contabilidade
- Representantes comerciais
- Funcionários fiscais do governo
- Engenheiros de telecomunicações
- Sociólogos, antropólogos e profissionais relacionados
- Planejadores de eventos e conferências
- Agiotas e emprestadores de dinheiro
- Gerentes de filiais de serviços financeiros e seguros
- Instrutores de tecnologia da informação
- Arquivistas e curadores
- Filósofos, historiadores e cientistas políticos
- Apresentadores de rádio, televisão e outras mídias
- Técnicos de suporte ao usuário de TIC
- Analistas de gestão e organização
- Escriturários de biblioteca
- Vendedores porta a porta
- Profissionais de recursos humanos e carreiras
- Avaliadores e peritos de perdas
- Funcionários de benefícios sociais do governo
- Apostadores, crupiês e trabalhadores relacionados
- Gerentes de serviços de TIC
- Gerentes de varejo e atacado
- Cartógrafos e agrimensores
- Corretores comerciais
- Agentes de serviços empresariais não classificados em outras categorias
- Escriturários de produção
- Profissionais de relações públicas
- Supervisores de escritório
- Funcionários de licenciamento do governo
- Técnicos de operações de TIC
- Técnicos de redes e sistemas de computadores
- Cobradores de dívidas e trabalhadores relacionados
- Lojistas
- Gerentes de serviços e administração empresarial não classificados em outras categorias
- Engenheiros eletrônicos
- Trabalhadores de informação ao cliente não classificados em outras categorias
- Demonstradores de vendas
- Gerentes de vendas e marketing
- Profissionais de treinamento e desenvolvimento de pessoal
- Carteiros e classificadores de correspondência
- Biólogos, botânicos, zoólogos e profissionais relacionados
Gradiente 3: Algumas tarefas permanecem menos expostas, mas o potencial geral de automação está crescendo.
- Tradutores, intérpretes e outros linguistas
- Secretários
- Caixas de banco e escriturários relacionados
- Atendentes de call center (informações)
- Escribas e trabalhadores relacionados
- Consultores financeiros e de investimentos
- Programadores de aplicativos
- Designers e administradores de bancos de dados
- Administradores de sistemas
- Profissionais associados em estatística e matemática
- Agentes de despacho e encaminhamento
- Atendentes de informações
- Recepcionistas
- Matemáticos, atuários e estatísticos
- Consultores de viagens e escriturários
- Profissionais de publicidade e marketing
- Desenvolvedores de software e analistas de aplicativos não classificados em outras categorias
- Bibliotecários e profissionais de informação relacionados
- Economistas
- Autores e escritores relacionados
- Secretários jurídicos
- Entrevistadores de pesquisas e estudos de mercado
- Meteorologistas
- Jornalistas
- Secretários administrativos e executivos
- Operadores de telefonia
- Desenvolvedores de software
- Representantes de seguros
- Secretários médicos
- Técnicos web
- Profissionais de redes de computadores
- Técnicos de registros médicos e informações de saúde
- Contadores
- Profissionais de vendas de tecnologia da informação e comunicação
- Recepcionistas de hotéis
- Revisores e copidesques
- Profissionais de vendas técnicas e médicas
- Escriturários de transporte
Gradiente 4: A maior parte das tarefas tem alto risco de serem automatizadas.
- Digitadores de entrada de dados
- Datilógrafos e operadores de processamento de texto
- Escriturários de contabilidade e escrituração
- Escriturários de estatística, finanças e seguros
- Corretores de títulos e finanças
- Trabalhadores de apoio administrativo não classificados em outras categorias
- Analistas financeiros
- Escriturários de folha de pagamento
- Vendedores de call center
- Desenvolvedores web e multimídia
- Agentes de crédito e empréstimos
- Escriturários de escritório geral
- Escriturários de pessoal
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Luciane Scarazzati é jornalista e acredita no poder transformador da informação e da educação. Atuou nas equipes que lançaram a CNN Brasil e o site de notícias G1 e também trabalhou em outros importantes veículos de imprensa, como TV Globo, UOL e Jornal da Tarde.