Opinião: como criar uma cultura de alta performance no centro da estratégia do negócio
Isadora Gabriel, CHRO da Flash, reflete sobre como construir uma cultura de alta performance que equilibre resultado, bem-estar, autonomia e conexão.

Há pouco tempo li em um tool guide da Gartner que 62% dos profissionais consideram pessoalmente importante serem reconhecidos como profissionais de alta performance. O dado ficou na minha cabeça e me fez pensar: será que, de fato, entendemos o real impacto de uma cultura de alta performance?
Apesar de estar cada vez mais presente em discursos de especialistas, metas de negócio e até job descriptions, percebo que ainda se fala pouco sobre o que isso significa na prática. E talvez por isso o conceito ainda seja facilmente confundido com competitividade ou com uma busca desenfreada por produtividade.
Pela minha experiência, uma cultura de alta performance nasce no ponto de equilíbrio entre o indivíduo que atua no seu melhor e uma empresa que oferece as condições certas para que esse desempenho aconteça. E apesar de parecer simples, é um caminho bem desafiador, porque envolve variáveis individuais e organizacionais.
Para começar, é preciso desenvolver líderes que saibam conectar seus times ao que realmente importa. Neste cenário, o papel do RH é disseminar que só existe uma estratégia: a da companhia. Não existe “estratégia do RH” isolada. Existe o negócio e o papel da área de pessoas é apoiar a execução dessa estratégia.
É nesse espaço entre o que a organização precisa e o que as pessoas buscam que entra um conceito que, para mim, faz toda a diferença: o desafio do “e”.
Falei sobre ele no capítulo que escrevi para o livro Mulheres no RH – volume 3. Volta e meia, este tema aparece nas minhas reflexões e nas conversas com líderes. Isso porque o RH e a liderança enfrentam dilemas que não se resolvem com um “ou”. Não é uma coisa ou outra. Na maioria das vezes, é uma coisa e outra.
É a empresa e o colaborador.
É o resultado e o bem-estar.
É a liberdade e a conexão.
É a autonomia e a responsabilidade.
Na prática, são forças que precisam coexistir. E é justamente aí que está o desafio: não escolher um lado, mas aprender a sustentar os dois.
Nesse processo, boas conexões fazem toda a diferença. O desenvolvimento individual e coletivo passa por trocas significativas, como as que acontecem em mentorias profissionais. Já falei sobre isso na coluna anterior, mas vale reforçar: quando abrimos espaço para compartilhar experiências, aprendizados e desafios com escuta genuína, criamos vínculos que fortalecem a cultura e ajudam a sustentar a alta performance no longo prazo.
Na Flash, temos vivido esse desafio de forma bastante concreta. Depois de um crescimento acelerado nos últimos anos, percebemos que algumas bases da nossa cultura precisavam ser reforçadas.
Fizemos um diagnóstico de cultura que nos ajudou a entender onde estávamos e o que precisávamos fortalecer. O passo seguinte foi olhar para a liderança, porque, no fim do dia, a cultura se manifesta no que as pessoas vivem no cotidiano. Isso depende muito de como os líderes se comportam, do tipo de relação que constroem com seus times e de quanto conseguem traduzir os valores da empresa em decisões práticas.
Neste momento, estamos trabalhando com nossas lideranças para estabelecer uma gestão cada vez mais conectada com o que a empresa é e com o que ela quer ser. Como eu costumo dizer, alta performance se assemelha à construção de um prédio, que demanda tempo e várias mãos e cabeças diferentes para subir um andar por vez.
Como em toda construção, há aprendizados. Por aqui, aprendemos, por exemplo, que relações sólidas ainda são nosso maior diferencial, mas também nosso maior desafio. Aprendemos que conversas difíceis precisam acontecer, que feedback só é valioso quando é honesto e frequente e que transparência, confiança e escuta ativa não são bônus: são o ponto de partida de tudo.
O que vejo na prática é que esse contexto ajuda a desconstruir mitos sobre o que é alta performance. Como aquele de que performa melhor quem compete com os colegas ou o que associa performance a visibilidade ou ser “amigo da liderança”.
No fundo, entendo que esse é um caminho que passa por curiosidade intelectual, senso de time e clareza de impacto. E com a capacidade de se manter aprendendo, se reposicionando e entregando valor não só para a empresa, mas também para si mesmo.
Aliás, uma das grandes armadilhas é confundir alta performance com alta cobrança. São coisas bem diferentes, mas se a cultura não estiver bem desenhada, é fácil cruzar essa linha.
Por isso, entendo que não dá para falar de alta performance sem falar de saúde mental. Esse é outro “e” que precisa ser integrado. Não é alta performance ou equilíbrio. É alta performance e equilíbrio. É sobre como você organiza sua agenda, como sua liderança respeita seus limites, como a empresa estrutura o trabalho para que ele seja sustentável.
Se eu pudesse deixar um ponto de partida para quem quer construir uma cultura de alta performance, seria esse: comece pelo autoconhecimento. Depois, busque feedbacks, construa um plano de desenvolvimento consistente e cultive sua curiosidade.
No fim do dia, não existe cultura de alta performance sem pessoas comprometidas com o que estão fazendo e com o porquê estão fazendo. E ninguém faz isso sozinho. Toda história de alta performance é também uma jornada com boas conexões. É construção. E, talvez, o mais importante: é escolha.
Se quiser dividir sua visão sobre o tema, sigo por aqui.
Nos vemos na próxima coluna.

Isadora Gabriel é CHRO da Flash. Formada pela PUC São Paulo e com MBA Executivo pelo IESE Business School de Barcelona, tem mais de 15 anos de experiência na área de Recursos Humanos. Já passou por empresas como Único, Movile, Amaro, Banco Safra, Bolsa de Valores, Itaú, Telefônica e Unilever. Em sua coluna mensal no blog da Flash, fala sobre tendências e futuro do trabalho.