"É preciso ter mulheres na liderança estratégica das empresas, não só operacional”, diz CFO Izabela Yumi

Em entrevista exclusiva, executiva conta como é atuar em um setor majoritariamente masculino e discute os avanços em relação à diversidade nas finanças.

Flash

De acordo com o estudo Panorama Mulheres 2023, da consultoria Talenses Group em parceria com o Insper, entre os CEOs em atuação em companhias instaladas no país, as mulheres somam apenas 20%. Quando olhamos para os CFOs (chief finance officer), elas compõem um grupo ainda menor: não ultrapassam 13% do total, aponta um relatório produzido pela Assetz, também com o Insper.

Izabela Yumi, CFO da CIAL Dun & Bradstreet, empresa provedora de soluções e dados comerciais, faz parte deste pequeno grupo. A executiva construiu sua carreira em um dos segmentos de mercado em que a presença masculina é preponderante: as empresas de tecnologia. 

Especialista em estruturação e preparação de multinacionais de tecnologia para crescimento exponencial no Brasil, a CFO já passou por empresas como Rappi e Groupon, além de startups early stages e unicórnios. 

Coautora do livro “Mulheres nas Finanças” (ed. Leader), conselheira e mentora da FGV Ventures, no mês em que se celebra o Dia da Mulher, Izabela conversou com exclusividade com o blog da Flash. No papo, falou sobre machismo no trabalho e na área financeira, ESG, maternidade e mulheres na liderança. Confira a seguir:

Como você vê o machismo na área financeira? Um CFO mulher é alvo de machismo?

Izabela: O primeiro ponto importante é entender que, sim, existe machismo no ambiente de trabalho — não só na área financeira. A mulher já sofreu, sofre ou em algum momento sofrerá algum ato de machismo profissional. Talvez ela nem perceba.

E mesmo quando a mulher está em uma posição de liderança isso acontece. Homens, geralmente, têm suas ideias e sugestões levadas mais a sério. Fora isso, se a mulher é firme, é vista como rígida demais. Mas se um homem é firme, tudo bem. Até mesmo nós, mulheres, temos de tomar cuidado para não sermos machistas, porque esses estigmas estão enraizados dentro da gente.

Para chegarmos a um nível de equidade de gênero, em que a mulher esteja em um cargo de liderança e receba o mesmo salário que um homem, vamos levar dezenas de anos. Existem vários estudos sobre isso. Precisamos fazer um movimento proativo, justamente, para diminuir esse gap. O desafio está aí.

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Você, particularmente, já enfrentou o machismo por atuar em um meio majoritariamente masculino?

Izabela: A minha criação sempre teve como base mulheres muito fortes e a ideia de ser também forte, capaz, independente. Talvez por isso nunca me dei o direito de questionar sobre machismo. Inclusive, durante muitos anos, fui cega e achava que era mimimi. Minha postura era: ‘Vamos trabalhar, correr atrás, bora pra frente’.

Até que aconteceu um episódio. Eu estava participando de uma reunião, em que uma colega de trabalho apresentava uma solução para um desafio, mas estava sendo questionada de forma muito agressiva pelo líder global. Era algo muito absurdo.  Depois da reunião, pensei em ligar para saber como ela estava, mas achei que não deveria polemizar. 

Algumas semanas depois, houve outra reunião global, em que eu fiz uma apresentação para explicar algo que tinha acontecido por equívoco de um dos meus gerentes. Quando a reunião terminou, essa parceira me ligou, dizendo que já não tinha mais dúvidas da existência de machismo na empresa.

Isso porque a maneira como meu líder tinha me tratado e tratado o gerente que tinha criado todo o problema havia sido muito diferente. 

E como você lidou com a situação? 

Para mim, aquilo foi um banho de água fria. Fiquei em choque porque, até então, era eu quem estava sentindo pena dela. Eu não estava percebendo que acontecia comigo também, não me permiti enxergar.

Foi o primeiro fato em que conscientemente enxerguei o machismo. Depois, passei a entender e a perceber as diferenças. Comecei a ter conversas mais abertas com meus pares, com lideranças de outras áreas, e cheguei a fazer uma pesquisa: os heads confirmavam essa diferença. 

Você sente diferença no tratamento, é isto?

Izabela: Já entrei em reuniões com muitas pessoas em que somente eu era mulher e, em uma ocasião, enquanto eu estava conversando com um fornecedor, um colega veio me dizer que eu estava dando risada demais. Esse é apenas um exemplo de comentário absurdo, de fundo machista. Por que o homem pode rir e a mulher não pode?

Há um tempo, ouvi pessoas comentando coisas do tipo: se uma mulher bonita está em um cargo de liderança, precisa ser mais inteligente do que as outras mulheres para compensar. Mas compensar o que, não é possível ser bonita e tecnicamente competente?

Como faz para enfrentar essas situações?

Izabela: Uma das pessoas que me ajudou a romper com essas crenças foi a Carolina Strobel que, inclusive, é do ecossistema de startups. Fora isso, acredito que hoje se tem mais liberdade para questionar esses comentários, mas há 10 anos era algo que as pessoas falavam como se fosse muito normal. 

Isso acaba se refletindo no nosso comportamento. Já teve momentos em que preferi não me maquiar, por exemplo. Quantas mulheres deixam de usar uma saia, às vezes, com receio? Mas nós temos de abraçar o que somos. 

Você também é mãe, já perdeu alguma oportunidade por causa disso?

Izabela: Quando engravidei, minha prioridade passou a ser a Gabrielle, minha filha. Eu já era head de finanças e decidi fazer uma movimentação para ter equilíbrio entre vida pessoal e profissional, durante a licença maternidade.

Comecei a fazer entrevistas quando minha filha estava com dois, três meses e, por mais que você se planeje para uma entrevista de emprego, quando se tem um bebê recém-nascido as coisas podem sair do planejado. Algumas entrevistas fiz com a Gabi no meu colo, em outras situações, precisei pedir licença porque ela estava chorando. 

Ao final, algumas empresas não me retornaram. Em um dos processos seletivos, para uma empresa muito grande e conhecida, recebi o retorno negativo e, como conhecia o headhunter, pedi para ele me contar o motivo.

Ao me responder, ele já começou dizendo que não tinha nada a ver com o fato de eu ser mãe, mas que seria um trabalho muito intenso no começo, o que não condizia com o meu momento. Questionei que não era um momento. Eu não ia deixar de ser mãe em algum momento, maternidade é para o resto da vida.

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Você acredita que, com o avanço das pautas ESG, estamos avançando quando o assunto é equidade de gênero?  

Izabela: Atualmente, existem alguns movimentos de empresas que incentivam mulheres na liderança. Porém, quando você vai olhar, é na liderança operacional, não na estratégica. Muitas companhias anunciam que 40% dos seus líderes são diversos. Mas será que é assim no seu conselho? Na alta administração, em que realmente as decisões são tomadas, será que existe diversidade? É aqui que vemos que ainda há muito o que caminhar ainda. 

A própria B3, ao determinar que as empresas públicas devem ter um percentual de mulheres na alta liderança, e ao ter ela própria uma meta, incentiva todo o ambiente corporativo a se movimentar. Lá fora, essa é uma pauta mais avançada.  Eu acredito que todo esse movimento é positivo, mas é um percurso a se construir. E discutir ESG no Brasil é algo muito recente e, infelizmente, em certas situações, gera até polêmica. 

Há mais diversidade nas startups?

Izabela: Hoje, cerca de 90% dos investimentos no ecossistema das startups, o que representa bilhões de dólares por ano, vai para aquelas que são fundadas por homens. O que prova a discrepância até no meio da inovação. Falta investimento em diversidade.

No entanto, diversidade é estratégia, é sobrevivência para uma empresa, para que ela possa inovar. Ter um board e uma alta administração que pensem da mesma forma não é ser estratégico, é deixar de considerar as outras óticas pelas quais uma sociedade enxerga.  Do contrário se deixa de ver oportunidades, demandas, que estão gritando no mercado.

Qual a importância do networking para as mulheres que estão nas finanças? 

Izabela: É importantíssimo buscar comunidades com as quais você se identifique. Esse networking é primordial, porque são espaços em que você encontra pessoas com o mesmo propósito e que podem te ajudar a caminhar.

Durante muito tempo, achei que não podia pedir ajuda, que eu tinha de me virar para saber. Hoje, sei da importância de também levantar a mão e pedir ajuda. E ter uma rede ajuda muito, por exemplo, com um problema na empresa, um desafio, uma questão técnica. 

Possivelmente alguém já passou por aquela situação e pode auxiliar a chegar mais rápido a uma solução. Nada melhor do que se conectar com quem está mais alinhado com o seu propósito.

Você está em alguma comunidade de mulheres?

Izabela: Hoje, por exemplo, sou associada da W-CFO, uma comunidade de apoio com a qual me identifiquei muito. Discutimos temas técnicos e do dia a dia, todas estão focadas em buscar novas mulheres e ajudar para que elas cheguem à última cadeira de finanças nas empresas. 

Tem também a Sororitê, uma comunidade de mulheres investidoras-anjo que investem em startups fundadas por mulheres. É um espaço muito bacana, porque se discute muitas questões técnicas e há muita muita troca.

Agora, você acredita que ser mulher te ajuda como CFO?

Izabela: Seguramente. Quando se pensa em liderança humanizada, por exemplo, a mulher tem uma linha de empatia muito valiosa. No dia a dia, lidando com diferentes pessoas e com pontos de vista diversos, exercemos um olhar mais empático para as dores que estão acontecendo ali e trazemos soluções que fazem mais sentido. 

Acho também que a mulher se sobressai quando se trata de inteligência emocional, porque nós falamos mais sobre as emoções, olhamos mais para dentro de nós mesmas. E nunca se falou tanto sobre saúde mental e sobre sua importância no mundo corporativo como agora. Finalmente, não é? Saúde mental é autoconhecimento, é melhor qualidade de vida e bem-estar.

Sem falar na questão de a mulher saber equilibrar vários pratos ao mesmo tempo. Priorizar. Isso tem a ver com produtividade, pois quando você prioriza o que é mais importante, acaba gastando energia onde realmente precisa, e o time todo acaba sendo mais produtivo. 

Como você vê a questão da igualdade de gênero no futuro? 

Izabela: As gerações mais novas que estão chegando na sociedade e nas empresas são muito críticas, até porque a gente também vem educando nossos filhos, de todos os gêneros, em prol da diversidade. E isso é ótimo. O espaço para  discussão, para levantar a mão, é muito maior do que há alguns anos. 

Mas os desafios ainda existem, porque é um processo. E temos de insistir no processo. Quando se fala de machismo, historicamente, é algo de muitos e muitos anos. Entre mulheres, inclusive. 

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