Orçamento base zero: conheça a metodologia usada por empresas como GPA e 3G Capital
Entenda o que é o orçamento base zero e como ele pode ajudar as empresas a redefinir prioridades, evitar desperdícios e melhorar a eficiência.
Criada nos anos 1970, o orçamento base zero, ou simplesmente OBZ, logo se popularizou. Trata-se de um modelo de planejamento financeiro, utilizado por empresas e instituições públicas para projetar suas despesas e seus investimentos.
O principal diferencial desta metodologia é não se basear no histórico financeiro da organização. Ou seja, ao invés de lançar apenas novas despesas em um orçamento pré-existente, ele é planejado do zero.
Isso significa que seus custos, despesas, investimentos e prioridades são definidos, aprovados e revistos periodicamente, respeitando as necessidades da companhia naquele momento.
O orçamento base zero é empregado especialmente quando se quer ter mais visibilidade sobre a operação, transparência e equilíbrio nos gastos. Ou em momento de maior instabilidade financeira, já que é preciso revisar todo o orçamento.
Segundo o administrador e economista José Carlos de Souza Filho, professor da FIA Business School, essa metodologia fornece uma visão panorâmica do negócio, o que permite manter o foco no que for prioridade,
“Pela aplicação mais eficiente de recursos, o orçamento base zero evita os desperdícios e auxilia na redução dos gargalos financeiros, além de mitigar faltas de recursos”, afirma.
Neste texto, conversamos com especialistas para mostrar as aplicações do orçamento base zero, suas principais vantagens e desvantagens. Confira a seguir:
O que significa orçamento base zero?
O orçamento base zero é uma metodologia de planejamento financeiro criada nos Estados Unidos nos anos 1970 e que ganhou popularidade quando o então presidente do país, Jimmy Carter, determinou que ela fosse adotada em toda a esfera governamental, o que, de fato, não ocorreu por completo.
Entretanto, a partir daquele momento, o conceito da metodologia do orçamento base zero começou a se popularizar, com diversas empresas também passando a utilizá-lo.
E a popularidade continua em alta mesmo décadas depois. Prova disso é que, em 2017, um estudo da consultoria Bain & Company, que ouviu 406 empresas nos EUA mostrou que 38% delas adotavam o orçamento base zero.
Além de não se basear no histórico financeiro, um dos diferenciais da metodologia do orçamento base zero é o conceito de gestão matricial de despesas (GMD), que permite que mais de uma pessoa esteja olhando para uma mesma despesa.
“Facilita, assim, o levantamento de oportunidades para otimizar a alocação dos recursos financeiros”, avalia Guilherme Sales, gerente sênior da consultoria Peers Consulting & Technology.
Outra principal diferença do orçamento base zero para outros modelos de orçamento é a necessidade de revisão e reajustes constantes após ser colocado em prática.
Fora isso, apesar de sua implementação ser liderada, geralmente, pela figura do CEO e CFO, também fazem parte dela líderes de diversas outras áreas como RH, compras, marketing e outros.
“O sucesso depende diretamente do comprometimento e da garantia de que todos estejam olhando para as mesmas informações financeiras”, frisa o gerente sênior da Peers.
Como implementar um orçamento base zero?
Antes de dar início à construção do seu OBZ, a empresa precisa garantir o engajamento de seus executivos na empreitada, orienta Guilherme, para que todos estejam de acordo com as metas a serem estipuladas no processo.
Esse alinhamento, justifica, é essencial para desdobrar os objetivos com os times gerenciais. Garantir uma comunicação clara e transparente em toda a empresa também é fundamental.
De forma resumida, os principais passos para elaborar e implementar o orçamento base zero em uma empresa são:
- Revisar custos: cada operação deve investigar e analisar todas as suas despesas (como folha de pagamento e gastos com fornecedores). É fundamental identificar o que for custo essencial da operação, além de suas necessidades e prioridades.
- Mapear os custos: levantamento das despesas com projetos que já estão em curso na companhia.
- Calcular investimentos: Estimativa do aporte necessário para realização de tudo o que estiver na programação de cada área da companhia.
- Priorizar gastos: a partir do raio-X da empresa, é possível avaliar o que é prioritário para que o negócio atinja suas metas. Deve-se explorar estratégias para redução de custos e justificar cada gasto. “Deve-se partir do pressuposto de que nada está garantido e que todas as despesas serão discutidas e validadas pelo time executivo da empresa”, lembra Guilherme. Esse processo deve ser realizado com a colaboração das diversas áreas, além de envolver análises e planejamentos.
- Distribuir os investimentos por área: uma vez que já se sabe quais são as prioridades da empresa naquele momento, é possível saber quanto deverá ser repassado para cada área, projeto e atividade.
- Acompanhamento e reajustes: o orçamento base zero é um modelo dinâmico, que exige monitoramento constante de gastos. Por isso, mesmo após a implementação da nova metodologia, deve-se acompanhar o desempenho de cada área para reajustar investimentos e cortes sem perder de vista as prioridades.
Vantagens e desvantagens do orçamento base zero
Para especialistas, as vantagens de adotar o orçamento base zero não se limitam às finanças da companhia, já que a ferramenta também pode ajudar a mapear quais são os setores ineficientes ou que não trazem o retorno esperado, auxiliando em processos de reestruturações.
Uma vez que o olhar de todos passa a priorizar o uso inteligente dos recursos, outros benefícios são o estímulo à inovação e a melhoria do alinhamento para construir as estratégias dos departamentos, complementa Guilherme.
Porém, apesar dos benefícios, isso não quer dizer que o modelo de orçamento base zero vá se adequar em qualquer perfil de organização ou realidade. De acordo com o especialista Peers Consulting & Technology, o OBZ costuma ser aplicado em certos cenários e situações.
“Por ser capaz de promover mais visibilidade sobre os custos e as despesas, empresas recém-adquiridas e organizações que tenham passado por mudanças relevantes em seu quadro de executivos costumam adotá-lo”, afirma.
Porém, os especialistas dizem que empresas que apresentam mais maturidade em seus processos, informações e quadro pessoal se beneficiam mais do orçamento base zero. “Companhias com pouco tempo de atuação no mercado e que ainda não possuem uma estrutura sólida podem não aproveitar todo seu potencial. Isso porque utilizar a metodologia requer um conhecimento aprofundado de todas as operações (até para identificar o que não faz mais sentido)”, diz José Carlos, da FIA.
Para além de negócios com pouco tempo de estrada, não se recomenda o OBZ para empresas que estiverem enfrentando instabilidades financeiras significativas ou companhias que não possuem recursos (de tempo e pessoal) suficientes para conduzir uma revisão completa de seus gastos. O mesmo vale para casos em que os objetivos não estejam claros e situações em que não é possível obter dados precisos.
Confira a seguir as principais vantagens e desvantagens da metodologia:
Vantagens do orçamento base zero
- Mais controle financeiro sobre a empresa;
- Decisões com foco nas prioridades da companhia;
- Identificação de desperdícios e oportunidades de redução de custos e gargalos financeiros;
- Aplicação eficiente dos recursos, evitando desperdícios;
- Priorização de investimentos de acordo com as metas e necessidades atuais;
- Estímulo à inovação e a eficiência nos times, devido ao foco no controle de gastos;
- Alinhamento na construção da estratégia de cada área;
- Olhar holístico para o negócio, o que melhora a percepção de integração entre as partes.
Desvantagens do orçamento base zero
- Demanda alto investimento de tempo e pessoas para elaboração e implementação, por não considerar os dados históricos a da empresa;
- Exige uma análise minuciosa de todas as despesas da empresa, o que só é possível quando há uma grande maturidade de informações;
- Demanda que exista um conhecimento de finanças disseminado dentro da empresa;
- Concentração de todos os recursos humanos do time de planejamento financeiro em sua execução – muitas vezes com a necessidade de contratar consultorias externa;
- Devido ao esforço envolvido em sua elaboração e constantes ajustes, pode gerar resistência entre os colaboradores.
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Quais são as três estruturas principais do orçamento base zero?
Segundo José Carlos, professor da FIA Business School, a metodologia do orçamento base zero está estruturada em três pilares:
Pacote Base Zero
Trata-se da organização dos gastos que devem ser considerados no novo orçamento que será projetado.
Variáveis Base Zero
Aqui, as contas contábeis são identificadas, classificadas e organizadas para que os gastos sejam inseridos posteriormente.
Núcleo Base Zero
É a consolidação dos outros níveis, ou seja, o encontro dos gastos com as contas (lembrando que gastos podem ser custos, investimentos ou despesas).
De fusão a implantação estatal: exemplos de empresas que utilizam o orçamento base zero
Guilherme, da Peers Consulting, cita que o grupo de investimentos 3G Capital adotou a metodologia quando anunciou a fusão de sua empresa Heinz com a Kraft Food, em 2015, conforme noticiado na época. E que a metodologia teria ajudado no faturamento da empresa, cujo um dos fundadores é Jorge Paulo Lemann.
Já o professor da FIA Business School menciona outro case de sucesso no país. “O grupo varejista GPA, proprietário do Pão de Açúcar, adotou o orçamento base zero para ampliar sua lucratividade, o que gerou uma economia combinada de 360 milhões de reais”, afirma.
Em 2022, o governo do estado de Minas Gerais também anunciou a implantação do OBZ em 38 de seus órgãos governamentais. Na ocasião, o subsecretário de Planejamento e Orçamento, Felipe Sousa, afirmou que o objetivo era poder elencar as prioridades para receber os investimentos públicos.
Ou seja, de maneira geral, empresas que adotam o orçamento base zero relatam melhorias significativas em eficiência operacional, redução de custos e aumento da rentabilidade.
“Porém, há sempre um risco de se concentrar demais em cortar gastos, diminuindo uma visão a longo prazo do que se é mais estratégico para a companhia”, finaliza Guilherme.
Repórter da Unicamp, formada na USP. Tem vasta experiência em produção de conteúdo para mídias digital e impressa, e assessoria de imprensa. Passou por Grupo Folha, Record e Microsoft.