Tony's Chocolonely e Patagonia: empresas apostam em propósito como modelo de negócio
No SXSW 2025, líderes reuniram-se para discutir o steward ownership—um modelo que promete garantir que empresas mantenham sua missão ao longo do tempo.

Por décadas, o mundo corporativo foi regido por um princípio inquestionável: maximizar o retorno aos acionistas. No entanto, essa lógica começa a ser desafiada por modelos empresariais que equilibram lucro e impacto social. No SXSW 2025, líderes do setor reuniram-se para discutir o steward ownership—um modelo que promete garantir que empresas mantenham sua missão ao longo do tempo.
Empresários, gestores de RH e líderes financeiros podem enxergar uma nova perspectiva nesse modelo, que pode redefinir as bases da governança empresarial e das relações com funcionários e consumidores. Mas como isso funciona na prática? E quais desafios precisam ser superados para que essa abordagem ganhe escala?
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O que é steward ownership?
Apresentado por Annika Schneider, líder de parcerias internacionais da Purpose Foundation, o modelo de steward ownership propõe separar controle e capital, garantindo que a missão da empresa permaneça protegida, sem o risco de ser comprometida por investidores que buscam apenas retorno rápido.
De acordo com a discussão, esse modelo permite que o poder de decisão esteja nas mãos de gestores comprometidos com os valores da empresa, em vez de acionistas externos.
Veja exemplos de empresas que adotaram o modelo:
Tony’s Chocolonely: erradicando a exploração na indústria do cacau
Katarina Bottenberg, da conselheira geral da Tony’s Chocolonely, compartilhou os desafios da marca ao enfrentar problemas estruturais na cadeia de suprimentos do chocolate. Segundo Bottenberg, a missão é erradicar a exploração, principalmente nas plantações de cacau. A empresa busca eliminar o trabalho infantil e garantir renda justa para os produtores da matéria-prima.
A abordagem da Tony’s inclui alguns princípios para um fornecimento ético, que são:
- Pagar preços acima do mercado para agricultores, porque a empresa entende que a pobreza é o motor para fazer com que práticas inadequadas continuem existindo.
- Estabelecer parcerias com outras empresas interessadas em um abastecimento mais responsável.
- Pesquisar sobre o histórico dos fornecedores da companhia e se eles adotam boas práticas.
- Investir em programas de assistência aos produtores da África Ocidental para melhorar a produtividade e diminuir a pobreza. Um dos exemplos é o incentivo para que os produtores invistam em outros cultivos, além do cacau, para que não dependam completamente da cadeia produtiva desta matéria-prima.
Esse tipo de iniciativa ilustra como modelos de governança voltados para impacto podem transformar setores inteiros.
A Tony’s criou o Tony’s Mission Lock, que é um mecanismo que tem como objetivo garantir que a missão da empresa seja mantida, independentemente da estrutura acionária da companhia – o foco é erradicar a exploração do trabalho infantil e outras práticas ilegais que são praticadas na cadeia produtiva do chocolate. O grupo é formado por três membros independentes, que podem tomar medidas caso considerem que a companhia está desviando de sua missão.
Patagonia: um caso de sucesso em governança sustentável
A Patagonia, um dos primeiros nomes a implementar conceitos de steward ownership, criou uma estrutura com direito a votos na companhia para garantir que a missão seja sempre seguida.
Com uma longa história de compromisso ambiental, a Patagonia alinha seu modelo de negócios a práticas responsáveis. A gestão da empresa inclui ações concretas, como o uso de algodão orgânico na produção de suas peças, além do reinvestimento de lucros para preservação ambiental.
Greg Curtis, diretor executivo da Patagonia, afirma que a empresa criou dois tipos de ações: uma delas garante votos na hora de tomada de decisão da empresa, enquanto a segunda, não.
“Nós recapitalizamos a companhia para que tivéssemos o mínimo de ações com direito a voto, porque achamos que precisávamos ter um benefício econômico dentro de uma organização sem fins lucrativos que criamos. As ações sem direito a voto representam 98% do total”, afirma Curtis.
Assista ao vídeo especial que preparamos durante a cobertura do SXSW 2025:
Quais os benefícios para empresas e líderes?
Empresas que adotam o steward ownership relatam três vantagens principais:
- Decisões a longo prazo: redução da pressão por resultados trimestrais, priorizando sustentabilidade e inovação.
- Maior confiança de stakeholders: equipes e consumidores valorizam companhias comprometidas com um propósito claro.
- Vantagem competitiva: em um mercado em que propósito importa, empresas com valores bem definidos tendem a atrair mais talentos e clientes.
No entanto, o modelo também apresenta desafios, como a necessidade de comunicação clara para stakeholders e a adaptação às regulações locais. Casos como a Patagonia e as empresas europeias que adotaram o conceito mostram que, quando bem planejada, essa transição pode ser bem-sucedida.
Para gestores de pessoas, o steward ownership representa um grande atrativo para engajamento e retenção de talentos. Funcionários tendem a se conectar mais profundamente com empresas que demonstram um compromisso genuíno com impacto social e ambiental. Além disso, esse modelo abre novas possibilidades para estruturas de incentivos que vão além das tradicionais participações acionárias baseadas exclusivamente no lucro.

É videomaker sênior na Flash. Formada em audiovisual, tem experiência em desenvolvimento de identidade visual, fotografia, design, animação e edição de vídeos. Viajou ao Texas, Estados Unidos, para fazer cobertura especial do SXSW 2025 para o blog e as redes sociais da Flash.