Cargo de Confiança: regras, requisitos e o risco da falsa designação (CLT Art. 62, II)
Descubra o que é cargo de confiança conforme a CLT, bem como os requisitos, as regras de jornada de trabalho, horas extras e gratificações.

O cargo de confiança é uma das classificações mais complexas da legislação trabalhista brasileira.
Essa categoria permite que a empresa dispense o controle formal de jornada, mas só pode ser aplicada quando requisitos legais rigorosos são atendidos.
Não à toa, muitos profissionais de RH e gestores têm dúvidas sobre quando um cargo pode ser enquadrado como de confiança e quais os riscos de um uso inadequado.
Neste artigo, você vai entender o que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) estabelece sobre o tema (com base nos artigos 62 e 224), quais são os critérios para enquadramento, os direitos e deveres envolvidos e como formalizar corretamente essa condição.
Assim, sua empresa garante segurança jurídica e transparência tanto para lideranças quanto para colaboradores.
O que é cargo de confiança, segundo a CLT?
O cargo de confiança é aquele em que o empregado exerce funções de alta responsabilidade e gestão, com autonomia para comandar, fiscalizar e tomar decisões estratégicas.
De acordo com o artigo 62, inciso II, da CLT, esses profissionais não se submetem ao controle formal de jornada, ficando dispensados da marcação de ponto e do pagamento direto de horas extras — desde que todos os requisitos legais sejam cumpridos.
Leia também: Qual é a diferença entre chefe e líder?
O que não é cargo de confiança?
O simples fato de um colaborador ocupar um cargo de liderança ou supervisão não garante seu enquadramento como cargo de confiança.
Ficam fora dessa categoria:
- Funções meramente técnicas ou operacionais sem autoridade decisória efetivo;
- Supervisão que não envolva independência ou mando significativo;
- Gestores que ainda continuam sujeitos a controle de ponto ou limitação rígida de horário — isso fere os critérios legais do cargo de confiança.
O que mudou pós‑reforma trabalhista?
Com a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), o conceito formal de cargo de confiança permaneceu essencialmente o mesmo, mantendo o art. 62, II.
No entanto, a reforma trouxe mais atenção ao tema do controle de jornada e à aplicação de horas extras em casos indevidos.
Decisões judiciais após a atualização da legislação têm exigido provas robustas de que o cargo cumpre todos os requisitos legais, elevando o grau de atenção do RH no momento de designação.
Requisitos da CLT para ser considerado um cargo de confiança
Para um colaborador ser enquadrado como cargo de confiança, não basta o título no organograma.
As leis trabalhistas definem critérios objetivos que precisam ser cumulativos.
Ignorar essas exigências pode levar a autuações trabalhistas e à descaracterização, obrigando o empregador a pagar horas extras retroativas, por exemplo.
Confira os principais requisitos legais:
Elevado padrão hierárquico e poder de mando e gestão
O ocupante de cargo de confiança deve exercer arbítrio de comando em suas responsabilidades, com emancipação para tomar decisões estratégicas, ou operacionais, relevantes. Isso inclui:
- Capacidade de admitir, punir ou demitir subordinados;
- Tomada de decisões sem necessidade de aprovação constante;
- Participação em comitês ou conselhos com peso na governança da empresa;
- Influência direta sobre resultados, orçamentos e pessoas.
A jurisprudência trabalhista reforça que a real autoridade prática deve prevalecer sobre o nome do cargo.
Ou seja, não basta ter o título de “gerente”, é necessário comprovar o exercício efetivo do poder de gestão.
Recebimento da gratificação de 40% ou mais
O Art. 62 também estabelece que o empregado em cargo de confiança deve receber uma gratificação mínima de 40%, sobre o salário do cargo efetivo.
Esse adicional deve constar no holerite como parte fixa e recorrente da remuneração.
A ausência dessa gratificação ou valores abaixo do exigido pode descaracterizar a condição de confiança, sujeitando a empresa ao pagamento de diferenças salariais e encargos.
Ausência de controle de jornada
O colaborador em cargo de confiança não deve estar sujeito a marcação de ponto ou a qualquer tipo de controle, seja manual, eletrônico ou por sistemas alternativos.
Na prática, isso significa que:
- Os empregados têm liberdade para definir sua rotina de trabalho;
- Não há exigência de horários fixos de entrada, saída ou intervalo;
- A jornada pode variar conforme as demandas da função.
Se o profissional estiver registrando ponto ou submetido a uma gestão rígida de horários, não poderá ser enquadrado como cargo de confiança, mesmo que exerça atividades de gestão ou receba gratificação.
Como funciona o cargo de confiança?
O cargo de confiança não se resume à ausência de registro de ponto ou ao pagamento de gratificação.
Envolve uma relação profissional pautada por expectativas elevadas de responsabilidade, autonomia e confidencialidade.
Além disso, exige cuidados formais por parte da empresa, desde o enquadramento até a eventual reversão.
Direitos e deveres de um cargo de confiança
O profissional em cargo de confiança representa a empresa e deve exercer sua liderança com responsabilidade, ética e discrição.
Durante o período em que ocupa essa posição, seus principais deveres incluem:
- Tomar decisões estratégicas ou operacionais em nome da empresa;
- Representar a liderança em determinados assuntos ou áreas;
- Atuar com confidencialidade sobre dados sensíveis ou estratégicos;
- Manter conduta exemplar, ainda mais em relação à cultura e às normas internas.
Em contrapartida, esses trabalhadores têm o direito à remuneração diferenciada, maior liberdade e, em geral, participação em decisões que moldam a empresa.
Jornada de trabalho, horas extras e adicionais (como o adicional noturno)
Por definição legal, o cargo de confiança não se submete a controle de jornada, conforme o artigo 62, II da CLT. Isso implica que:
- Cargo de confiança tem direito a hora extra? Não, salvo acordos específicos ou descaracterização do cargo;
- Não há adicional noturno, salvo previsão expressa ou convenção coletiva;
- A empresa deve garantir que o colaborador tenha equilíbrio entre vida pessoal e profissional, mesmo com autonomia de horário.
Em situações onde o colaborador é incluído em sistemas de controle de ponto, perde-se a natureza do cargo de confiança, podendo gerar passivos.
Como formalizar o cargo de confiança, segundo a legislação trabalhista?
A formalização do cargo de confiança é essencial para garantir respaldo jurídico à empresa. Por isso, deve ser incluída a condição no contrato de trabalho, mencionando o art. 62, II da CLT.
Devem ser informados, também, o cargo ocupado e o pagamento da gratificação de 40% ou mais, registrando a função na Carteira de Trabalho (CTPS).
O que deve constar no contrato de trabalho e na CTPS?
Para evitar dúvidas futuras, o contrato e a CTPS devem conter:
- Cargo ocupado e natureza de confiança (ex: gerente geral, diretor de operações);
- Valor ou percentual da gratificação de função;
- Cláusula destacando que o colaborador não está sujeito ao controle de jornada, conforme o artigo 62, II da CLT;
- Eventual previsão sobre reversão ou perda do cargo.
Reversão do cargo de confiança: cuidados e direitos trabalhistas
A empresa pode, a qualquer momento, retirar a função de confiança de um trabalhador, seja por decisão estratégica, reestruturação ou desempenho.
No entanto, é fundamental observar algumas regras: a reversão deve ser formalizada por escrito, com comunicação clara ao profissional.
O que acontece com a gratificação de função (súmula 372 do TST)
O profissional retorna ao salário-base anterior, sem a gratificação. Entretanto, se a gratificação tiver sido paga por mais de 10 anos, o entendimento da Súmula 372 do TST (Tribunal Superior do Trabalho) é de que ela integra o salário em definitivo, não podendo ser retirada.
Ou seja, além de um cuidado técnico, a reversão exige avaliação jurídica e de clima organizacional para que não gere desmotivação ou passivos trabalhistas.
Exemplos de cargos de confiança típicos
Embora a CLT não traga uma lista fechada de cargos de confiança, a jurisprudência e a prática de mercado ajudam a identificar quais funções costumam se enquadrar nessa classificação.
Abaixo, listamos exemplos comuns de cargos que, quando exercidos com as condições previstas na legislação, podem ser considerados cargos de confiança:
- Diretores estatutários ou executivos com poderes de decisão ampla;
- Gerentes gerais com autarquia sobre orçamento, pessoas e processos;
- Superintendentes ou coordenadores que têm jurisdição para admitir, advertir ou demitir;
- Gestores regionais ou de unidade, que lideram operações independentes;
- Chefes de setor com autoridade delegada e autonomia operacional, sem registro de jornada;
- Responsáveis por áreas sensíveis, como compliance, jurídico ou auditoria, com acesso a informações estratégicas.
É importante lembrar que a função em si não garante o enquadramento como cargo de confiança. O que define isso é o conjunto de condições exercidas na prática e formalizadas por documentos.
Checklist rápido: como o setor de Recursos Humanos deve gerir cargos de confiança
Para evitar passivos trabalhistas e garantir que o enquadramento como cargo de confiança esteja conforme a CLT, o setor de Recursos Humanos (RH) precisa adotar critérios objetivos, consistentes e documentados.
Veja um checklist prático para essa gestão:
- Verificar se o cargo envolve poder de mando: o colaborador tem autonomia real para tomar decisões relevantes, liderar pessoas ou controlar processos?
- Confirmar a ausência de controle de jornada: o profissional não está submetido a sistemas de ponto físico, eletrônico ou digital?
- Garantir o pagamento da gratificação mínima de 40%: o valor está sendo pago regularmente no holerite e corresponde ao exigido por lei?
- Formalizar no contrato e na CTPS: há cláusulas claras que enquadram o colaborador no art. 62, II da CLT e indicam a gratificação de função?
- Revisar com periodicidade as funções exercidas: o cargo ainda cumpre os requisitos legais ou houve alterações práticas na rotina?
- Registrar eventual reversão do cargo: caso o colaborador volte a uma posição comum, o RH deve formalizar a mudança e analisar se a gratificação integra ou não o salário (com base na Súmula 372 do TST).
- Capacitar gestores sobre os limites da função: líderes que ocupam cargo de confiança devem entender suas obrigações legais e os cuidados que evitam descaracterizações.
Esse acompanhamento contínuo evita erros no enquadramento, protege a empresa contra ações trabalhistas e garante clareza para todos os envolvidos.
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O meu trabalho é encontrar soluções de conteúdo e desenvolver histórias nos momentos certos. Para isso, uso todos os tipos de linguagem a que tenho acesso: escrita criativa, fotografia, audiovisual, entre outras possibilidades que aparecem ao longo do caminho.