'Felicidade não é perfumaria, é estratégia': 8 práticas para ter times mais felizes em 2026
Especialistas explicam como felicidade no trabalho impulsiona resultados e o que fazer em 2026.
O desengajamento no trabalho vai além da insatisfação individual. Ele afeta diretamente a saúde mental dos colaboradores, aumenta a rotatividade, reduz a produtividade e gera perdas estimadas em R$ 77 bilhões por ano para as empresas brasileiras, segundo o Engaja S/A. Nesse cenário, a felicidade no trabalho deixa de ser um tema periférico e passa a ocupar o centro da estratégia de negócios, cultura organizacional e sustentabilidade do crescimento.
Por que colaboradores desengajados custam caro às empresas? Quando um colaborador está infeliz e desengajado, os prejuízos aparecem em múltiplas camadas: clima organizacional deteriorado, queda de produtividade, aumento de erros, retrabalho e redução da capacidade de inovação.
“Quando falamos de um colaborador infeliz, desengajado, estamos falando de prejuízo em várias camadas. E não é nada abstrato. Na prática, isso vira clima pesado, perda de energia criativa, mais erros, mais retrabalho e uma velocidade muito menor para resolver qualquer coisa. Com o olhar de RH, fica fácil ver que a rotatividade sobe, o custo de recrutamento aumenta, a produtividade cai, os projetos atrasam", afirma Irina Bezzan, CEO da Talentx Digital e Presidente Associação Campinas Tech.
Para a especialista, um outro fator importante precisa entrar nesta conta, embora pareça invisível: a oportunidade perdida. “Uma pessoa desengajada deixa de trazer ideias, de colaborar, de ser aquela força viva que faz a empresa crescer. Começa a remar contra sem perceber. Isso não aparece no Excel, mas derruba qualquer negócio a longo prazo. Um colaborador infeliz custa caro demais a si mesmo, ao time e ao negócio. A conta sempre chega, só que de formas diferentes”, completa.
Felicidade no trabalho como estratégia de ESG e performance
A criação de áreas dedicadas ao bem-estar reforça uma tendência clara: empresas com colaboradores mais felizes engajam mais, retêm talentos e performam melhor. Mas as especialistas ouvidas pela Flash garantem: boas práticas do dia a dia, ainda que sem uma área estruturada para o bem-estar do trabalhador, podem fazer muito pela sua saúde mental, impactando todo o ambiente.
“Quando a gente vê empresas criando áreas específicas para olhar a felicidade do colaborador, na prática elas estão assumindo que gente feliz entrega mais, se conecta mais e fica mais na empresa. E isso conversa totalmente com a letra do ‘S’ do ESG, porque não dá para falar de impacto social sem começar pelo impacto que você gera dentro de casa", diz Irina.
Para a especialista, palestrante em futuro do trabalho, quando a empresa cuida das pessoas, elas retribuem. “Elas vão cuidar do negócio de um jeito que nenhuma estratégia sozinha dá conta. Eu posso dizer que felicidade no trabalho não é perfumaria, é estratégia. No fim das contas, é criar um lugar onde as pessoas pensem que vale a pena estar."
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Engajamento no mundo: o que dizem os dados
Segundo Juliana Sawaia, cientista e pesquisadora da felicidade, nos últimos anos, a felicidade no trabalho passou a ser um tema de negócio e um indicador de performance.
“Quando olhamos para os dados, isso fica muito claro. Se ampliarmos o olhar para o cenário global, o relatório State of the Global Workplace 2025, da Gallup, mostra que apenas 21% dos trabalhadores no mundo estão engajados, enquanto 62% não estão engajados e 17% estão ativamente desengajados. O estudo estima que essa falta de envolvimento custa cerca de US$ 8,9 trilhões em produtividade perdida, o equivalente a 9% do PIB global", pontua Juliana.
Na avaliação da cientista, embora a maior parte das empresas do Brasil já reconheça a importância do tema, ainda que não tenha um desenho sistêmico de cultura, liderança e modelo de trabalho, ainda há organizações que só olham para o assunto quando já existe um problema grave, como processos trabalhistas, afastamentos por adoecimento mental ou crises internas de clima ou imagem. “Nessas, a ‘felicidade’ ainda é vista como ação cosmética, não como variável de gestão.”
Modelo e escala de trabalho fazem a diferença
Temas do mundo corporativo atual, as discussões sobre modelo e escala de trabalho têm impacto na equação da felicidade no trabalho, afirma Juliana. “Elas determinam duas variáveis fundamentais para o bem-estar: autonomia e tempo de recuperação.”
Para a especialista, quando o desenho da jornada limita a capacidade da pessoa de organizar sua vida, descansar adequadamente ou exercer alguma escolha sobre como e onde trabalha, a experiência de felicidade tende a se deteriorar, independentemente do cargo, setor ou formato. No tema das escalas, o efeito é semelhante.
“O 6x1, muito comum no varejo e serviços, tende a gerar desgaste porque reduz o tempo disponível para recomposição física e mental, sobretudo entre profissionais com múltiplas responsabilidades fora do trabalho. Já escalas longas, como 12x36, exigem contrapartidas estruturadas de descanso para evitar impactos sobre sono, saúde e desempenho", completa a pesquisadora.
Nesse contexto, dados do Engaja S/A mostram que iniciativas como day off de aniversário, short friday ou políticas claras de pausas são percebidas como essenciais e não como benefícios acessórios. “Mas é importante ressaltar que modelos de trabalho precisam funcionar dentro das condições da operação, da cultura e do setor. A felicidade no trabalho emerge quando há um ponto de equilíbrio entre as necessidades humanas e as do negócio, não por um modelo específico, mas porque as práticas reconhecem que gente não é recurso renovável: precisa de ritmo, previsibilidade e espaços de recuperação para performar bem", opina Juliana.
Atenção às lideranças!
Olhar para a felicidade dos colaboradores passa por uma atenção especial às lideranças. Os gestores são os responsáveis pelo clima emocional do time. “Quando estamos bem como líderes, a equipe sente. Quando estamos exaustos, ansiosos ou desconectados, a equipe sente também. Quando estou sobrecarregada, a tendência é uma piora na comunicação, com decisões tomadas de maneira mais reativa, perdendo a paciência, com menos consistência. E isso vai minando uma coisa muito importante: a confiança do time", avalia Irina.
Segundo o Engaja S/A, houve um recuo preocupante no engajamento das lideranças: entre executivos, o índice caiu de 72% para 65% em um ano — a maior retração por hierarquia — e a gerência média passou de 54% para 49%. Sintomas de exaustão também são mais prevalentes nesse grupo: 25% dos executivos relatam ansiedade diária e 21% insônia.
“Entendo que se os índices de engajamento das lideranças estão caindo, isso acende um super sinal de alerta: continuamos pedindo demais e cuidando de menos. E um líder esgotado não puxa inovação, não inspira, não sustenta cultura", diz a CEO da Talentx Digital.
Para Juliana, o estado emocional do líder é um dos principais “termômetros” do time. “Já foi comprovado que 70% da variação do engajamento de uma equipe é explicada pelo gestor direto; um dos achados mais importantes da Gallup. Portanto, quando esse gestor está esgotado, ansioso ou desengajado, essa condição se transmite na forma de decisões mais reativas, microgestão, falta de presença nas conversas e menor capacidade de reconhecer esforços.”
Na medida em que cuidar da saúde mental dos líderes deve ser o primeiro passo de qualquer estratégia de felicidade organizacional, quando a liderança tem condições de exercer o próprio papel com presença, clareza e energia emocional, os ganhos são imediatos em clima, retenção e desempenho. “Na prática, a saúde mental do líder se transforma na saúde emocional do time. E isso é um ativo competitivo", afirma a pesquisadora.
8 práticas para ter times mais felizes e engajados em 2026
Já de olho em 2026, reunimos 8 práticas que podem ajudar a engajar os colaboradores no ano que vem, de acordo com as especialistas ouvidas pela Flash:
1. Pesquisas contínuasSegundo Irina, pesquisas são essenciais, mas é preciso estratégia para que os resultados sejam bem aproveitados. “Não se trata apenas daquelas pesquisas longas trimestrais para mensurar clima, que às vezes o pessoal nem aguenta responder. Estamos falando de pesquisa contínua, algumas ferramentas como pulso, feedbacks rápidos e aqueles emojis semanais que o colaborador usa para definir como se sentiu. Isso ajuda a sentir o clima quase em tempo real.
2. Acolhimento a temas sensíveisCom dados das pesquisas em mãos, empresas conseguem ter mais instrumentos para implementar programas de psicoterapia, prevenção ao burnout e canais de acolhimento.
3. Mapeamento da jornada do colaboradorIrina reforça ainda a importância de o RH se organizar para que sua área de DHO (Desenvolvimento Humano e Organizacional) consiga mapear a jornada do colaborador. “Para entender onde estão os atritos, as frustrações, os processos que adoecem, e aí ajustar. Às vezes, melhorar uma ferramenta interna ou mudar uma política de ponto impacta mais a felicidade do que qualquer campanha bonita", diz.
4. Liderança preparadaNão há ambiente saudável com uma liderança despreparada. É preciso desenvolver treinamentos específicos para gestores, que têm de estar aptos a lidar com questões que podem abalar colaboradores no dia a dia. Mais do que isso, diz Juliana, é importante olhar para a saúde mental desses profissionais. “Líderes exaustos não conseguem criar ambientes seguros, claros e motivadores. Proteger a capacidade emocional da liderança, com pausas reais, carga viável de trabalho e acesso a apoio psicológico, é uma das formas mais diretas de melhorar a experiência do time.”
5. Revisar processos internosIrina lembra da importância de olhar para processos internos que todos sabem que geram atrito e prejudicam o fluxo do trabalho. “Sabe aqueles procedimentos de que todo mundo reclama, mas ninguém mexe? Melhorar isso deixa o ambiente muito mais leve. Processo ruim cansa mais que muita demanda", diz.
6. Conversas sobre a pessoa e não sobre a tarefaJuliana lembra que não é preciso ter uma estrutura formal para que se estabeleça, por exemplo, a rotina de conversas de qualidade. “Há práticas simples e altamente efetivas. Vale pensar em encontros regulares que tratam da pessoa, não apenas das tarefas, com perguntas claras, como ‘O que tem sido mais pesado?’ ou ‘O que te daria mais energia nesta semana?’, que podem reduzir ambiguidade, fortalecer vínculos e aumentar a sensação de apoio”, pontua.
7. Reconhecimento específico e frequente“Estudos mostram que colaboradores que se sentem reconhecidos têm mais energia emocional, mais iniciativa e menor propensão ao turnover", diz Juliana. Segundo a cientista, pequenos rituais de valorização, como nomear uma contribuição, explicitar o impacto de um comportamento e celebrar progressos são boas maneiras de reconhecer a qualidade do trabalho dos colaboradores, o que tem efeitos diretos em bem-estar, produtividade e retenção.
8. A construção também se dá no dia a dia“Muita coisa boa não depende de uma área sofisticada ou de grandes investimentos. Felicidade no trabalho, no dia a dia, nasce de microatitudes que qualquer líder ou RH pode colocar em prática", diz Irina. A especialista lista algumas:
- Escuta sem julgamento
- Contextualizar atitudes ajuda a reduzir a ansiedade e aumenta a confiança e a sensação de pertencimento
- Expectativas claras com alinhamentos em profundidade evitam frustração, insegurança e conflitos
- Flexibilizar na medida do possível com foco em resultados, dando autonomia aos colaboradores
- Ritual de check-in rápido nas reuniões, quando todos os participantes falam sobre como estão chegando àquele momento
- Transparência sobre decisões e compartilhamento de boas práticas ajudam a engajar e contribuem para o aprendizado
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Jornalista e mãe do Martin. Além de colaborar com a Flash, é assessora de imprensa na área de música e escreve sobre cultura em veículos de imprensa.

